quinta-feira, outubro 24, 2002

Dia 23. Minhas contas pagas, dinheiro suficiente, comida, carro, luz, família. E eu reclamo. Que direito tenho eu de reclamar? Que direito tenho eu de chorar o "amor do cursinho"? Sadoquemais? Tenho todo. Quando disseram que eu não devia deixar o cabelo crescer, deixei. Cansei, cortei. Quando eu disse que não ia enlouquecer estudando e ia passar, duvidaram. Fui, passei. Disseram que eu não ia ter coragem de me mudar. Levantei, juntei, mudei. Quando eu digo que não vou assinar nenhuma certidão de casamento, duvidam, quando digo que vou embora, duvidam. Aceite. mundo senso comum: as pessoas são diferentes. Aceite, mundo senso comum: as pessoas ultrapassam os clichês. Aceite, mundo senso comum: as pessoas sentem diferente. Aceite. mundo senso comum: eu sou assim. E tu pode dizer o que quiser, chamar minha infelicidade de pequeno-burguesa, dizer que eu sou mimado e que eu vou acabar me descobrindo errado no final. Mas, aceite, mundo senso comum: mesmo unanimidades erram. Não tente me dizer que se eu não tivesse um teclado sob os dedos e um teto sobre a cabeça não teria esses sentimentos. Qual a tua autoridade, mundo senso comum, pra dizer o que e como eu sinto? Qual o teu poder, mundo senso comum, para adivinhar meu comportamento, ainda mais em situações hipotéticas? Posso, com sua licença, ser o maior estudioso em eu no mundo? Posso, com sua permissão, dizer que em outras condições eu seria o mesmo? Já passei tempo o suficiente sozinho comigo pra saber como eu sou. Talvez eu jamais vá descobrir porque sou, mas sou. Ponto. Aceite, mundo senso comum: não sou só eu que não me encaixo nos seus pré-moldes. Aceite, mundo senso comum: esses moldes foram feitos com muita má vontade. Muitas pessoas são grandes demais, tem conteúdo demais e transbordam os moldes. Retomando: tenho todo o direito de chorar o "amor do cursinho". Porque ele é meu, porque ele me fere de uma forma que tu não vê, porque ele dói de um jeito que tu não sabe, porque só eu sei o quanto de dor eu suporto, porque só eu sei de quanto amor eu preciso, porque só eu sei quanto eu preciso de amor. Mas não adianta, tu vai manter esse ar de superior, ou gritar até que não se ouça minha voz. Mas o grito mais alto é sempre de quem não tem argumento. Às vezes tu erra: aceita, mundo senso comum.

Nenhum comentário: